domingo, 23 de novembro de 2014

Maratona do Porto e o Pai

Muito diferente daquilo que publico, hoje transcrevo as palavras do meu pai na véspera de ir fazer a maratona do Porto, quase com um mês de atraso, mas publico quando me é possível. É com orgulho que publico as suas palavras, porque adoro a sua forma de escrever, deixa-me fascinada, é no mínimo uma escrita cativante, e também porque a sua força de vontade é inigualável!

"Portela de Sintra. Chega o comboio. Sento-me. A perna direita está torta e fica ao lado da perna esquerda, que por sinal é (não está) tão torta como a direita. Daqui não vai mal ao mundo. Contudo, quando estas têm pela frente correr uma maratona, no Porto, tudo muda de figura. Estou sem vontade de correr e parece que alguém do céu irá entornar potes de água sobre a cidade. O meu treino mais longo foram 20 km, suados e cansados e sofridos. 78 kg que teimam em não baixar. Concluí recentemente que não tenho sapatilhas decentes para esta corrida. As que tenho estão demasiado apertadas para fazer 42 km. E não são neutras. Ignorante destas coisas. E concluí que me danificam os gémeos. Posso comprar umas novas e fazer aquilo que não se deve fazer. Mas será um gozo. Posso correr descalço como quando era criança. Posso não correr. Posso fazer de conta que corro, e passeio. Irei. Quase morto no deserto... e o Porto aqui tão perto. Como diz a canção. Sinto o ritmo a desmoronar-se e a altimetria a elevar-se. As distâncias não se encurtam e o momento não engana. Mas o oxigénio que transporto no sangue tem pressa de viver futuros rápidos e próximos, futuros dos quais saudades morrem. A meta já foi atingida e estou em zona de viragem. A vida não são cestos de piqueniques. A vida são caminhadas para apanhar cogumelos e a consequência de os degustar. São lindos os magustos da minha terra. Mas não sei se ainda fazem magustos na minha terra. Ah! Lembrei-me! Há castanheiros na serra de Sintra. Na zona do Penedo. O anoitecer do tempo fez-me ver a beleza das coisas de maneira diferente. Ou, de outra forma, encontro beleza onde antes imaginava simplesmente ausência. Mas isto já vai longo, já saiu do percurso... e tenho uma reengenharia de modelo de dados para continuar, um treininho para fazer... tenho de sair do combóio. Subo a 5 de Outubro. Sinto as pernas presas. Falta de alongamentos decentes. Galveias em leitura. Estou na Guiné com o Joaquim Janeiro. Ah como viaja o meu pensamento. Porra preciso mesmo melhorar os meus alongamentos."



Foi para o Porto com o objectivo de acabar a maratona em 3h30. Por volta das 13h e pouco recebi uma mensagem:

- "Já acabei. 3:23:50. Estou muito contente. Vou ao banho."

Orgulhosa.

M.

2 comentários:

  1. UAU! O teu pai corre para caraças! :)
    Tens todos os motivos para estares muito orgulhosa. Os parabéns ao teu pai!

    Bons treinos!

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    1. SIIIIM!!! :D Pois corre!
      Não saí a ele, mas fico muito feliz por ele e muito orgulhosa!

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